Oriente Médio: Análise Geopolítica

Posições estratégicas e reservas de petróleo são os atrativos de região onde agravam-se os conflitos
A região comumente denominada de Oriente Médio (ou Oriente Próximo do ponto de vista geográfico dos europeus) é uma das mais estratégicas do planeta. A Palestina, cujas terras encontram-se no meio dessa região, desde a antiguidade e durante milhares de anos foi local de passagem para caravanas de comércio. Nessa grande porção de terras unem-se três continentes: Ásia, Europa (pelo mar Mediterrâneo) e a África (pelo mar Vermelho).

Há nessa área, porém, alguns pontos em particular, onde é preciso deter-se mais atentamente sobre suas localizações geográficas, para um melhor entendimento do quanto é importante, inclusive do ponto de vista militar, o Oriente Médio (2).

A primeira delas é o estreito denominado Bab el Mandeb. Este fica entre o Estado de Djibuti e a República do Iêmen, no mar Vermelho (bahr ahmar). É também o local onde ocorre o estreitamento do Golfo de Aden, que banha não só o Iêmen, mas toda a costa oeste da Arábia Saudita e a costa leste de vários países da África. O mar Vermelho é a ligação fundamental para se atingir o canal de Suez, no Egito.

Essa porção de mar representa uma linha de cerca de 50 km, situada entre o 14º e 15º paralelos e o 12º e 14º meridiano. Por ali passa boa parte dos navios em direção à Europa e ao norte da África, vindos da parte sul dos continentes africano e asiático.

Um segundo ponto estratégico da região é o Estreito de Ormutz, situado entre os países de Omã e Irã. É o ponto que liga o Golfo de Omã e o Golfo Pérsico-Arábico. A distância em linha reta entre esses dois países é de cerca de 120 km. Por essa área passam todos os navios para adentrar ao Golfo.

“Uma das sete frotas americanas estacionam sempre nas águas do Oriente Médio”.

Por aí circulam todos os super-petroleiros das grandes companhias petrolíferas, em especial os da Aramco – Cia. Petrolífera da Arábia Saudita –, maior produtora de petróleo do planeta. Esse ponto fica entre o 26º e o 28º paralelo e o 56º e o 58º meridiano.

Pelo menos uma, de todas as frotas navais da maior armada do planeta – a dos Estados Unidos – fica permanentemente na região marítima do Oriente Médio, ora nas águas do Golfo de Aden, ora no Pérsico-Arábico ou no mar Vermelho.

O último dos três pontos mais importantes e estratégicos de todo o Oriente Médio é o Canal de Suez. Esse canal, construído no século passado pelos ingleses e nacionalizado em 1956 pelo ex-presidente do Egito Gamal Abdel Nasser (falecido em 1970), é elo fundamental de ligação entre o mar Mediterrâneo e o mar Vermelho.

Tal canal separa o continente africano da região do Oriente Médio, na Península do Sinai (região essa ocupada pelo Estado de Israel na guerra dos 6 dias em 1967, mas devolvida ao Egito através dos acordos de paz de “Camp David”, de 1979). Sua posição geográfica situa-se entre os paralelos e meridianos 30º e 35º. São cerca de 150 km de terras e pequenos rios ligados artificialmente por canais e eclusas.

Pelos dados disponíveis no Quadro I, o mundo árabe hoje tem 239.506.000 habitantes, ou seja, 4,78% de todos os habitantes do planeta (de um total estimado de 5.003.500.000) e ocupam geograficamente 13.854.943 km2 de terras descontínuas, representando 10,84% de todo o planeta (3).


A região do Oriente Médio não é estratégica apenas pela sua localização, pela situação como encontram-se seus mares, terras e canais, mas fundamentalmente pelas suas reservas provadas e inferidas de petróleo.

O planeta continua sendo movido pela energia derivada de petróleo. Ainda que existam energias alternativas e se façam pesquisas sobre sua substituição – como é o caso do “Programa do Álcool” no Brasil – não há possibilidade de esse vir a ser substituído, pelo menos nos próximos 20 anos. Como muitos países industrializados estão com essas reservas praticamente esgotadas, é preciso, então, sob a ótica imperialista, controlar o petróleo dos outros.

Sabe-se que o petróleo como fonte de energia deverá estar esgotado, segundo os mais otimistas, nos próximos 35 anos, no máximo. Os mais pessimistas – e defensores de energias alternativas e menos poluentes – acreditam que o esgotamento ocorrerá nos próximos 15 anos. Isso significa, nesta última visão, que a partir de 2008, a humanidade deverá ter de investir na prospecção de tipos de petróleo e seus derivados, mais caros, do tipo não convencional, como xistos, areias betuminosas, óleos pesados, que demandam investimentos de mais de US$ 100.000.00 por barril/dia, enquanto hoje, a Arábia Saudita extrai petróleo com investimento de no máximo US$ 10.000.00 por barril/dia (4).
Segundo Nicolas Sarkis, diretor do Centro Árabe de Estudos do Petróleo, as reservas mundiais do óleo provadas e inferidas situam-se hoje (excluindo as reservas não descobertas) na casa de 635 bilhões de barris, e os países árabes detêm 62,4% desse total (396 bilhões de barris) e ainda controlam 21% das reservas mundiais de gás natural (5).

Conforme pode-se observar no Quadro II, os 13 países mencionados produzem apenas 34,04% de todo o petróleo que consomem. Dos 6,8 bilhões de barris que importam, 1,9 bilhões vem de países árabes (18,38%). O Brasil está entre os países que importam dos árabes elevadas quantias das suas necessidades (65%), como também a Itália (50%) e a Índia (48%) (6).

As grandes empresas petrolíferas existentes no planeta, conhecidas popularmente como “As Sete Irmãs”, são na verdade dez grandes empresas. Dessas, oito são americanas e apenas duas inglesas, conforme se pode observar no Quadro III. Tais empresas possuem as “suas reservas” de petróleo e boa parte dessas “reservas” provém de áreas cedidas por alguns países árabes (7).

“Texaco obtém 92% de todo o seu petróleo no mundo árabe. Exxon obtém 38%, Shell 29%”.

As reservas exploradas pelas 10 gigantes petrolíferas são da ordem de 35 bilhões de barris comprovados. De todo esse petróleo, pode-se dizer, que: de cada 4 barris extraídos do solo ou do mar, um é árabe ou persa e vem do Oriente Médio ou do Norte da África.
Isso traduzido em dólares (com dados de 1989), significa que dos 404,8 bilhões de dólares faturados por todas as empresas, US$ 104,51 bilhões vieram dos países árabes ou persa, significando, ainda, um lucro líquido vindo do Oriente Médio de US$ 9,233 bilhões. Tal riqueza não fica à disposição dos países exportadores.

  Pode-se ver que empresas como a Texaco obtêm 92% de todo o seu petróleo no mundo árabe, assim como a Exxon, 38% do total, a Atlantic 32%, a USX 31% e a Shell, 29%. Na questão da exploração propriamente dita, entendido esse termo no sentido de tirar a riqueza de um povo e enviar a outro, também aqui os países árabes fazem mau negócio. Especialmente aqueles cujas reservas são exploradas pelas companhias petrolíferas internacionais.

Com a queda acentuada dos preços do óleo desde 1986, e o acréscimo e criação de diversas taxas nos países industrializados, acabaram por acarretar uma maciça transferência de renda do petróleo dos países produtores para os países consumidores. Estima-se que no período de 1986-1992 foram transferidos cerca de 320 bilhões de dólares (9).

Segundo o professor José Walter Bautista Vidal, são dois tipos de países árabes: “(…) do ponto de vista do controle das reservas de petróleo, podemos classificar os países localizados no Oriente Médio em duas categorias. Na primeira estão aqueles em que as reservas de petróleo são concessões, por longo prazo, a corporações transnacionais de origem norte-americana e inglesa. Entre esses estão Kuwait, Omã, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, entre outros. Na segunda categoria estão os países em que o petróleo é patrimônio de seus povos (…)” (10). Neste último bloco encontram-se países como Iraque, Argélia, Tunísia, Iêmen, Sudão, Líbia etc.

Pode-se ter uma noção das reservas petrolíferas comprovadas no mundo, junto com as inferidas e as não-descobertas. Pelos números que se observa, envolvendo 10 países exportadores de petróleo, vê-se que os Árabes detêm 466,1 bilhões de barris, o que significa 43,60% do conjunto, ou ainda, 452,59% a mais que os Estados Unidos. Aqui não estão computadas ainda as reservas de países árabes menores.

Nessa situação, a ocupação do Kuwait desencadeada por Sadam Hussein, em agosto de 1990, sob o argumento de que este país era a sua 19ª província, gerou uma desestabilização na questão do controle das reservas petrolíferas mundiais. O Iraque estaria, assim, controlando quase 20% de todo o petróleo do mundo e poderia expandir-se para os micro-Estados árabes do Golfo e mesmo para a Arábia Saudita, podendo, se isso ocorresse, vir a controlar mais de 50% das reservas mundiais.
Prossegue o professor Bautista Vidal: “(…) como os países árabes controlam acima da metade das reservas restantes do petróleo recuperável do mundo, eles, e somente eles, serão capazes de promover, a partir de 2000, um aumento proporcional do mercado mundial. Esta foi a principal razão da guerra de janeiro/fevereiro de 1991, no Golfo (…)”.
Em todo o planeta movimenta-se por ano 460 bilhões de dólares na remuneração do petróleo produzido. Se acrescentar a isso os derivados e os ramos petroquímico, transporte e toda a comercialização auxiliar, esses valores atingem quase dois trilhões de dólares ao ano.
Ora, com a aproximação do fim da era do domínio dos Estados Unidos na indústria do petróleo e com o crescimento das estatais (revista Petroleum & Energy Inteligence, janeiro de 1991), editoriais de revistas e jornais internacionais especializados vêm estimulando a privatização do petróleo nacionalizado (revista Offshore, janeiro de 1990).

“Petróleo disponível: 5% estão nos EUA, 13% na ex-URSS e 56% nos países da OPEP”.

Com a recente elevação da produção petrolífera da Arábia Saudita para patamar superior a 8,3 milhões de barris/dia, resultando num preocupado editorial da revista World Oil (dezembro de 1990), quando se pensava que esta só conseguiria atingir 7 milhões, conclui-se que a questão do petróleo é, também, uma questão de poder. “A geopolítica do petróleo é um capítulo da geopolítica da dominação”. Não é objeto do presente trabalho abordar a questão do crescimento e da influência do islamismo no Oriente Médio e particularmente o aumento de fiéis da corrente denominada “fundamentalismo islâmico” em todo o mundo árabe. Mas já é uma realidade o ressurgimento do poder dos árabes, “povos de cultura milenar fortemente enraizada, e acrescentando-se aí a força religiosa do Islã, de conteúdo marcadamente antiimperialista.

O confronto com as grandes potências industriais militares é praticamente inevitável”.
Com base ainda nos dados do Quadro IV, conclui-se que, de todo o petróleo original recuperável, cerca de 600 bilhões de barris estão disponíveis, sendo que 21% encontram-se do lado ocidental (126 bilhões), e os Estados Unidos detêm apenas 5% (30 bilhões), a ex-URSS 13% (78 bilhões) e os países da OPEP 56% (ou 336 bilhões).

Pode-se dimensionar a importância estratégica mundial do petróleo, quando se trabalha com cálculo da produção e do consumo mundial. O consumo de um ano de todo o planeta é estimado em 20 bilhões de barris. Pelos números que se tem, as reservas americanas de óleo dariam para abastecer o planta por apenas 1 ano e 6 meses, as da ex-URSS para 3 anos e 9 meses, enquanto as reservas da OPEP, o cartel do óleo, dariam para assegurar o consumo de todo o mundo por 16 anos e 8 meses.
Os árabes têm se mostrado imensamente superiores aos americanos na questão do petróleo. Isso pode ser medido apenas pelo item da produtividade. Pelos dados disponíveis em 1989, a Arábia Saudita possuía apenas 858 super-poços petrolíferos, enquanto os Estados Unidos tinham 612.448. Cada poço saudita produziu nesse ano uma média diária de 5.668,4 barris/dia, contra apenas 12,5 barris/dia dos poços americanos. As reservas sauditas do óleo são da ordem de 257,5 bilhões, ou seja, 898,06% maiores que a dos Estados Unidos.

Em tempo: a questão do petróleo é tão conflitiva, que na decretação do primeiro choque do petróleo em 1973, quando o barril de óleo era comercializado a US$ 2,70 e pulou para US$ 11,20 em 1974, chegando a US$ 34,20, chegou a ter início um conflito que poderia ter envolvido EUA e a URSS. Nos conflitos dos reféns da embaixada americana de Teerã de 1979, chegou a haver mobilização dos efetivos militares da OTAN e do Pacto de Varsóvia.

Após a vitória militar americana contra o Iraque na guerra de janeiro de 1991, propalou-se que uma nova ordem mundial havia sido instaurada. Que o mundo marcharia para uma época do fim da bipolaridade. Todas as barreiras nacionais e de fronteiras deveriam ser quebradas. Parecia que o planeta agora teria um novo e único “dono”.

Ocorre que a ONU, nesse novo contexto, não tem cumprido um papel para o qual foi constituída em 1945, quando os aliados vitoriosos da Segunda Guerra Mundial votaram a “Carta das Nações”, uma espécie de estatuto da Organização. Esse texto diz que a ONU deve procurar alcançar a paz entre os povos e respeitar a sua auto-soberania e determinação.

O que se tem visto quando da ocupação do Kuwait pelo Iraque, é que o seu Conselho de Segurança, em especial com a capitulação da ex-URSS – membro permanente e tem direito a veto às suas decisões –, tem servido de instrumento para a política externa norte-americana.
As decisões da ONU sempre foram – e deveriam continuar sendo – recomendatárias e nunca impositivas. A ONU não tem poder de decidir se um país pode ser ou não invadido por tropas e outros países membros, e que o executor de tais decisões será sempre o poderoso exército americano.

“Zonas de exclusão relacionam-se à revisão do conceito de soberania absoluta das nações”.

Nessa conjuntura atual, não faltam estudiosos e analistas que proponham uma revisão profunda dos conceitos clássicos de soberania nacional e auto-determinação dos povos, ou como dizem: “conceito limitado e relativo de soberania”.

O Prof. Paul Wilkinson, diretor do Instituto de Pesquisa para Estudo de Conflitos e do Terrorismo da Inglaterra, afirma: “(…) a criação de zonas de exclusão, embargos decretados pela ONU e envio de tropas de ocupação podem estar relacionados com a tentativa de revisão do conceito de soberania absoluta de um Estado nação (…)”.

O correspondente do Jornal do Brasil em Londres, Mário Andrade Silva, refletindo, talvez, sua opinião
pessoal ou tentando constatar a realidade, afirma: “(…) os Estados Unidos, como a maior potência militar, transformaram-se no único herdeiro da confiança mundial depois da guerra fria (…)”.
Ainda nesse mesmo despacho, o correspondente afirmava: “(…) o poder de coação da presença militar americana serve como um eficaz instrumento de paz em muitas regiões do mundo (…)”. Tal ponto de vista bélico e intervencionista, chamado de “moderno”, desrespeita tudo o que se entende por soberania nacional e autodeterminação de um povo.

Nestes tempos difíceis, após o fim da bipolaridade, a ONU tem procurado formar seu próprio exército, de tal forma que não precise chamar os “irmãos” do norte e seu poderoso exército. Tal força militar, chamada de “Forças de Paz” ou “Capacetes Azuis”, já existe e atua em vários pontos da Terra.
Isso demanda uma despesa imensa. A ONU gastou (somente em 1991), 3,092 bilhões de dólares com a manutenção de um exército de apenas 45.364 homens espalhados por 12 países. Isso significa um gasto de US$ 5. 679.98 com cada soldado por mês. De todas essas 12 regiões onde atua o exército da ONU, metade delas é de regiões árabe-palestinas (22).

No recente episódio do bombardeio a Bagdá, no mês de janeiro de 1993, na véspera da mudança de presidente nos EUA, essa situação ficou muito clara. A ONU usa claramente dois pesos e duas medidas no tratamento com seus países membros. Em 11 de janeiro, Joe Sills, porta-voz do Secretário-Geral Boutros Ghalli, declarou: “(…) a recuperação de material de base de d’Qum-Qasr deveria ser feita até 15 de janeiro, em cumprimento às determinações do Monuik (Mission d’Observatios des Nations Unies pour l’Irak et le Kowit). As autoridades iraquianas aceitaram essas determinações e isso explica as intensas atividades durante o fim da semana de 8 a 10 de janeiro (…)” (23).

As movimentações exclusivamente civis desencadeadas pelo Iraque eram apenas e tão somente para retirar materiais iraquianos deixados na região fronteiriça entre os dois países em conflito, expressamente autorizadas pela ONU. Mas a imprensa mundial chamou essa atitude de “invasão” do Kuwait pelo exército do Iraque. Os próprios países árabes, aliados dos Estados Unidos, condenaram com energia o bombardeio a Bagdá. A Liga dos Estados Árabes emitiu comunicado assinado por todos os ministros de relações exteriores árabes. Mesmo as potências ocidentais, como França e Inglaterra, também desaprovaram o ato do governo de George Bush.

Os dois pesos e duas medidas adotados pela ONU ficam claros pela impotência da Organização para controlar o conflito étnico na Bósnia-Herzegovina. Mais escandalosa é a posição da ONU com relação a Israel. São dezenas, para não dizer centenas, de resoluções contra as atitudes dos israelenses – desde 1948 – e todas essas, simplesmente, não são acatadas. São ignoradas e nada se faz. Mais recentemente, em 16 de dezembro de 1992, Israel expulsou para o Líbano 415 palestinos de tendência fundamentalista islâmica ligados ao grupo Hamas.

“Quatrocentos e quinze palestinos foram deportados por Israel. Resolução da ONU até hoje não foi cumprida”.

A ONU também condenou a atitude de deportar palestinos. A comunidade internacional também desaprovou. A deliberação unânime do Conselho de Segurança contou, pela primeira vez, com o voto dos Estados Unidos. Mas nada foi cumprido e nada foi feito. Os palestinos continuam no que a imprensa insiste em chamar de “terra de ninguém”, uma faixa de 10 km ao sul do Líbano, ocupada militarmente pelo exército de Israel.

Persistem os problemas e os conflitos na região do Oriente Médio. Não é objetivo do presente trabalho aprofundar a questão palestina, um dos problemas mais centrais da região. No entanto, a expulsão, já mencionada no capítulo anterior, alterou os rumos dos acontecimentos.

É lamentável que a deliberação por parte do governo israelense de expulsar palestinos de suas terras tenha contado inclusive com o apoio de 3 partidos de “esquerda”, que possuem 12 deputados no parlamento de Israel (Knesset) e integram a coalizão governista do primeiro-ministro Itzshak Rabin. Tais organizações participam da frente denominada “Meretz” e assinaram a ordem de deportação e degredo (24).

Segundo, ainda, Alain Gresh: “(…) a repressão na Cisjordânia e Gaza é a mais sangrenta que jamais se viu (…). A expulsão de 415 palestinos muçulmanos para o Líbano, que não são acusados ou culpados de nem mesmo um crime, é um ato sem precedente desde 1967 (…)” (25).
Mas não são só os problemas palestinos que aumentam. Mesmo entre os países que se alinharam com o Estados Unidos na guerra contra o Iraque, há problemas e divergências. Os micro-Estados de Bahrein, Omã, Catar, (integrantes co Conselho de Cooperação do Golfo) engalfinham-se em conflitos fronteiriços, apesar de serem extremamente pequenos. Segundo um analista político francês, citado pelo Le Monde Diplomatique, “(…) a região do golfo é hoje mais vulnerável do que antes da invasão do Kuwait (...)” (26).

A propalada democratização que deveria ter ocorrido no Kuwait, após o fim da guerra, não saiu do papel. As eleições realizadas não garantiram o acesso ao voto para a grande maioria da população. A família Al-Sabah continua dominando todo o emirado. Segundo Gilles Kraemer, “(…) quanto à lei eleitoral, só têm direitos políticos os kuwaitianos de primeira classe, ou seja, pessoas cujas famílias se instalaram no país antes de 1920 (...)” (27).

De todos os países do mundo árabe no Oriente Médio e Norte da África, oito são monarquias, todas elas feudais e absolutistas. O modelo de tipo capitalista implementado nesses países é ainda incipiente. Praticamente tudo o que se consome é importado dos europeus e dos americanos. Não há indústria de base, de produção de maquinaria pesada. O produto que dita as regras da economia é o petróleo e sua poderosa indústria. Os príncipes, emires, reis e sultões gastam quase todas as suas riquezas, e as advindas do lucro do petróleo, em outros países.

Só para ilustrar como é pouca a democracia no Oriente Médio, pode-se ver o exemplo da Arábia Saudita, onde o rei Ibn Saud presta conta, se quiser, a um Conselho Consultivo (majlis ashshura) integrado em sua maioria por membros da “família real”. No Kuwait, a família real que “governa” o país é composta por mais de 2.000 príncipes.

Quadro V 
Pode-se ter uma noção exata da pouca democracia existente no Oriente Médio, pela longevidade dos chefes de Estado dos países árabes. Mesmo nas repúblicas Árabes, os presidentes praticamente não são eleitos pelo voto direto, como nos modelos conhecidos de democracia ocidentais.
Há problemas, ainda, no Oriente Médio com relação à militarização dos países. Com a quebra do poder militar no Iraque, outros países na região cresceram militarmente. No Iraque restaram 382.500 homens, de um total de mais de 1 milhão antes da guerra. Restaram ainda 703 tanques, de um total anterior à guerra de mais de 4.000 sobraram, ainda, 1.403 blindados (50% de antes da guerra) e 340 peças de artilharia (10% anteriores à guerra).

Nesse quadro, de país mais militarizado do Oriente Médio, o Iraque passa a 3º lugar entre os árabes perdendo em termos de tamanho de seus exércitos para o Egito (com 420.000 homens), e para a Síria (com 404.000 homens). Ao todo, no mundo árabe, com base em dados de 1991, existem 2.077.750 homens nas forças armadas que, se pudessem ser considerados como um exército único, seriam o 3º maior exército do planeta, perdendo apenas para a China e os Estados Unidos.
“Paz só virá com a devolução das terras árabes ocupadas pelo Estado de Israel”.


Só para ter uma idéia do índice de militarização dos países árabes, pode-se fazer uma rápida comparação com a maior potência militar do planeta: os Estados Unidos. Nesse país, existe um soldado para cada grupo de 126,22 habitantes. No mundo árabe, o índice de militarização é de um soldado para cada grupo de 107,98 habitantes, ou seja, 16,89% a mais do que os EUA.

Mas, há casos de militarização impressionante, até mesmo para países controlados pelas suas forças armadas. São os casos da Síria (um soldado para 31,01 habitantes), da Jordânia (um para 32,42), dos Emirados Árabes Unidos (um para 44,20). Pode-se dizer que o país menos militarizado é o Sudão que, apesar de seu imenso território, possui um soldado para 407, 39 habitantes.

Já o Estado de Israel possui, hoje, forças armadas com 175.000 homens (1 soldado para cada 29,08 habitantes, o maior índice de militarização de todo o Oriente Médio). Conta ainda com: 3.890 tanques de combate; 5.000 veículos blindados; 2.662 aviões de combate. Isso sem dizer (tudo indica) que ele detém o controle do ciclo do urânio, já tendo fabricado armamentos nucleares.

O maior problema em toda a região continua sendo o de terra. E Israel sabe que é o centro de todos os conflitos e responsável pelo elevado grau de tensão. Isso porque este país persiste em ocupar militarmente não somente as terras palestinas designadas pela ONU – desde o plano de partilha aprovado em 29 de novembro de 1947 –, mas também as de praticamente todos os seus vizinhos, como Líbano (ao sul, numa faixa territorial de 10 km), Jordânia, tem problemas com o Egito e com a Síria (ocupa as estratégicas colinas de Golã).

Sobre as colinas de Golã, é importante que se detenha um pouco. Elas estão situadas a cerca de 60 km da capital administrativa de Israel, Tel Aviv.

Sabe-se que a Síria possui hoje mais de mil tanques soviéticos, modelos T-62 e T-72, dos mais modernos. Chegam a atingir em linha reta, a velocidade de mais de 100 km/h e transportam, com conforto, seis soldados, possuem mira a laser etc.
Israel sabe que, numa situação hipotética, se uma coluna de centenas de tanques perfilar-se no alto dessa colina e, mesmo que com seus motores desligados, apenas com o embalo do declive geográfico descessem as colinas, bastariam a essa fileira de tanques de 15 a 20 minutos para atingir a Capital israelense. Por isso, é pouco provável que Israel devolva Golã paras os sírios.

As negociações para a tentativa de paz em toda a região, iniciadas na Conferência de Madri em outubro de 1991, patrocinada por ONU, EUA e a então URSS, deverão ter o seu prosseguimento em 20 de abril, em Washington (se não forem suspensas). Todos devem reivindicar as suas terras de volta, tomadas por Israel.

A estratégia israelense é tentar negociar acordos em separado, quebrando uma certa unidade árabe conseguida até o presente momento. Fala-se em acordos bilaterais com Síria, Líbano etc, numa tentativa de isolar os palestinos e sua entidade representativa, a OLP.

Seja observadores internacionais idôneos, jornalistas, estudiosos da questão, todos sabem, sem exceção, que a paz só poderá ser estabelecida em toda a região com a concessão feita pelo Estado de Israel. E a paz só virá com a devolução das terras árabes ocupadas.

Por tudo que aqui se viu, as previsões são as mais pessimistas. Em função da posição geográfica da região, em função da quantidade de petróleo nas mãos dos árabes, em função da crescente militarização de toda a área, do crescimento acelerado do fundamentalismo islâmico, do aumento do nacionalismo árabe e dos interesses americanos e imperialistas do Golfo Pérsico-Arábico e Oriente Médio em geral, pode-se esperar o pior.

Não são poucos os analistas internacionais que prevêem a eclosão de um novo conflito de grandes proporções no mundo. Claude Julien, jornalista francês, previa mesmo antes da Guerra do Golfo de forma taxativa: “(…) mesmo com uma vitória total sobre o Iraque, as perspectivas de paz no Oriente Médio serão as piores do que nunca (…)”. E todos acabam sendo unânimes em afirmar que tal conflito deverá passar pelo Oriente Médio, região estratégica do planeta.

* Sociólogo, professor de Métodos e Técnicas de Pesquisas e de Sociologia da Universidade Metodista de Piracicaba, Pós-graduando em Filosofia.
Agradeço ao engenheiro Antonio Antunes, diretor da Câmara de Empresas Nacionais de Capital Nacional (CEBRACAN), pelas referências bibliográficas sobre petróleo, fundamentais para este trabalho.

** O presente artigo tem por objetivo fazer uma análise mais detida sobre a real situação em que se encontra a região geográfica da Terra denominada “Oriente Médio”. Não se entrará, aqui, em aspectos culturais, religiosos e históricos dos povos da região.

O trabalho se propõe abordar a região do ponto de vista geopolítico, fornecendo um panorama, ao mesmo tempo estratégico do ponto de vista estritamente geográfico, bem como do ponto de vista político, internacional e mesmo militar.

Serão abordados, ainda que em linhas gerais, aspectos da situação dos países árabes, questões internas dos 21 povos que compõem a nação árabe. O papel da ONU como instituição política de grande importância também é mencionado.

Finalmente, com dados e números, os mais atualizados possíveis, será feita uma análise da geopolítica do petróleo, encarado como energia estratégica da humanidade, pelo qual esta ainda dependerá pelo menos nos próximos 20 anos.

Do ponto de vista metodológico, o presente artigo é uma abordagem essencialmente teórica e bibliográfica, não tendo sido feita nenhuma pesquisa empírica mais sistematizada sobre o assunto.
Encontraram-se dificuldades especiais referentes às bibliografias cotidianas, revistas e jornais, à medida que as poucas disponíveis no mercado editorial brasileiro são importadas nos idiomas inglês, francês, espanhol e árabe, este último de domínio linguístico bastante complexo.

Não há muitas informações disponíveis no país sobre o Oriente Médio, ou pelo menos não há divulgação de maior amplitude para um público, ainda que leigo, mas interessado. Não há centros de pesquisa e de referência sobre o assunto. Não há revistas especializadas sobre arabismo (1).

Notas:
(1) Uma ou outra publicação que se tem é de caráter meramente social, recreativo e cultural da comunidade árabe, como a revista Chams, de cultura, dirigida por Raul Tarek, com o n. 4 editado em agosto de 1992; ou a revista Alvorada, sobre islamismo, editada por Samir El Havek, com o n. 20, janeiro de 1993; ou ainda, a revista Carta Informativa, de comércio, editada por Omar Haman, com o n. 137, junho de 1992.
(2) A presente caracterização geográfica foi feita utilizando o Atlas Universal, editado em conjunto pelo jornal Le Monde e Selection Reader’s Digest, Paris, França, edição de outubro de 1982. (3) Dados obtidos a partir das seguintes fontes disponíveis: a) Revista Carta Informativa, da Câmara de Comércio Árabe Brasileira n. 137, junho/agosto, 1992. São Paulo, p. 16-37; b) Almanaque Abril e Almanaques Lisa, 1993; c) Enciclopédia “Larousse Cultural”, Círculo do Livro, 30 volumes, São Paulo, 1983; e d) Livro do Ano, 1993, Encyclopeadia Brittanica, São Paulo/Inglaterra.
(4) LEITE, Rogério César de Cerqueira. “O Mito do Petróleo Inesgotável”, Folha de S. Paulo, 26-12-1992, p. 3, caderno de Economia.
(5) “L’inquietante Baisse de Revenus du Petróle”, Le Monde Diplomatique, França, n. 467, ano 40, de fevereiro de 1993, p. 6.
(6) KEWDEYER, S. & COOPER, D. “Where the Oil Flows”, Revista Fortune, EUA, volume 122, n. 6, de 10-09-1990, p. 47-49.
(7) A revista Fortune, de março de 1993, divulga as 25 maiores empresas em faturamento do planeta. A Exxon, como nos anos anteriores, é a segunda em faturamento, perdendo só para a GM. Essa empresa petrolífera faturou em 1992, 103,775 bilhões de dólares. Entre as dez maiores, 4 são petrolíferas: Exxon, a Mobil (US$ 57,39 bilhões), a Chevron (US$ 37,46 bilhões) e a Texaco (US$ 37,13 bilhões). Fonte: Folha de São Paulo, caderno 2, p. 9, 31-03-1993.

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